Quantas mais celebridades, personalidades, e ícones musicais temos ainda sobrando para serem o foco de filmes biográficos? Se depender de Um Completo Desconhecido (A Complete Unknown, 2024), talvez, muitas mais, afinal, o longa sobre o cantor Bob Dylan faz esse tipo de filme ganhar um novo sopro e se depender dele, contar esse tipo de história, deve ser uma coisa que ainda será repetido por mais algum tempo em Hollywood. Isso, claro, se os próximos filmes (e a celebridade escolhida), for feito de maneira correta, coisa que este longa em particular faz muito bem.
Afinal, depois que Bohemian Rhapsody lá em 2018 foi lançado e indicado ao Oscar muitos tentaram replicar o sucesso de público e de prêmios vencidos na temporada de premiações, que o longa teve. Alguns com mais sucesso como Elvis e até mesmo Rocketman sobre Elton John, outros com menos como o I Wanna Dance With Somebody sobre Whitney Houston.

Mas o que parecia ser mais uma fórmula que sofreu um desgaste com o tempo, ganhou uma nova sobrevida com o longa focado na vida de Bob Dylan. E mesmo não sendo um nome de peso globalmente igual Elvis, Madonna (cuja a biopic foi adiada), Michael Jackson (o próximo a ter um lançamento nos cinemas no ano) e até mesmo a própria Whitney Houston, o que faz a diferença em Um Completo Desconhecido é a presença do multitalentoso Timothée Chalamet no papel do cantor, e claro, da direção classuda que James Mangold imprime para a biopic.
O queridinho do Film twitter, cinéfilos de plantão e da geração z, usuários do Letterboxd, Chalamet vem de uma carreira meteórica recente e usou a popularidade da parte 2 de Duna, lançada no ano passado, para alavancar a divulgação de Um Completo Desconhecido,e é realmente, quem é o grande chamariz para o projeto. O ator é um dos mais jovens em Hollywood a garantir novamente uma indicação ao Oscar, aqui pelo papel do cantor, e quem sabe até ganhar (é um dos favoritos!) o careca dourado para casa numa temporada extremamente competitiva e sem muitos favoritos.
E não é por nada, mas Chalamet aqui entrega uma performance eletrizante e realmente bastante interessante de se assistir. O recorte de Um Completo Desconhecido é simples, e claro para usar e amplificar a atuação de Chalament, e acerta ao mostrar os passos de Bob Dylan em deixar sua marca no mundo da música principalmente num momento cultural, político e econômico que os EUA viviam no final dos anos 60 que é faz parte da narrativa ao ajudar a contar essa história, esse coming of age, assim por dizer, de um jovem que precisa encontrar sua própria voz ao soltar ela em cima de um palco.
E Chalamet canta boa parte delas. E ao fazer isso, além de entregar uma atuação extremamente competente, o ator entrega passagens completamente fascinantes de se assistir. Claro, as semelhanças físicas estão ali, do cabelo, do carão por trás dos óculos, na silhueta mais magra, e tudo mais, mas é na postura, na voz, e nos trejeitos que o ator realmente vende essa história que realmente sabe atingir todas as notas ao entregar, antes de mais nada, um filme, com uma narrativa, com personagens que vêm e vão, sem apenas se apoiar no vasto catálogo musical ou em reproduzir e ticar cenas chaves específicas com datas e momentos conhecidos a serem replicados.
E para isso, James Mangold (que cuidou também da direção) e Jay Cocks usam o efervescente cenário musical da música folk dos anos 60 para fazer com que o roteiro insira o espectador nessa história e nas diversas fases que vemos, e acompanhamos, Dylan ao longo dos anos mostrados no filme.
Do relacionamento com uma das companheiras, a jovem Sylie (Elle Fanning) para com o empresário e espécie de mentor Pete (Edward Norton) e ainda a relação com outros cantores conhecidos da época como Joan Baez (uma incrível Monica Barbaro, também indicada ao Oscar por sua performance) e também Johnny Cash (um irreconhecível Boyd Holbrook) que curiosamente foi o protagonista de um outro filme musical biopic dirigido por James Mangold, Johnny & June (Walk the Line, 2025), a trama de Um Completo Desconhecido usa todos eles para nos cercar numa narrativa que conta a chegada de Dylan no epicentro musical em Nova York.
E para depois, aos poucos, passar pelas dificuldades em se apresentar, gravar os discos, até mesmo pelas suas apresentações no Newport Folk Festival, e também pincelar pela narrativa do artista atormentado pela fama e sucesso de vendas, que o fizeram ser de um desconhecido para um mega astro.
Assim, Chalamet usa o roteiro dado e vai por criar e pintar essa narrativa de contar uma história de quem é e quem Dylan gostaria de ser. Do jovem meio tímido, para o galanteador e até mesmo para a figura rebelde e do gênio incompreendido, Chalamet acerta no tom encontrado em todos eles e realmente está muito bem no papel. Afinal, o ator deixa transparecer as camadas da figura complexa que Dylan transparecia ser e que são amplificadas na medida que a fama o alcança.

“Você é meio que um cuzão, Bob!” afirma um dos personagens do filme em um dos momentos que Um Completo Desconhecido segue a cartilha do arco narrativo do jovem que se torna uma figura conhecida e precisa lidar com as consequências disso. No meio de figurinos caprichados, uma recriação de época impecável e momentos musicais da época com visuais extremamente bem elaboradas em que vemos Chalamet soltar a voz, Um Completo Desconhecido conta essa jornada da forma mais bonita e cheia de profundidade possível e que emociona principalmente nos momentos finais quando vemos uma das apresentações de Dylan, já estabelecido no cenário musical e que levou milhares de pessoas para o festival de música folk.
Ao contar a história de como Dylan se adaptou para os novos tempos, optou pelo uso da guitarra elétrica, e se lançou como uma figura única no cenário musical folk, Um Completo Desconhecido vem numa crescente impressionante, onde Chalamet apenas comprova ser um dos nomes mais empolgantes e talentosos da geração atual que trabalha em Hollywood.
Um Completo Desconhecido chega nos cinemas nacionais em 27 de fevereiro.