Do que se trata 7 Prisioneiros:
Com direção de Alexandre Moratto, o longa é estrelado pelos atores Christian Malheiros e Rodrigo Santoro e chegou no TIFF depois de ter passado por Veneza no começo do mês.
Na trama, o jovem Mateus (Malheiros) sai do interior em busca de uma oportunidade de trabalho em um ferro velho de São Paulo comandado por Luca (Santoro). Chegando lá, acaba se tornando vítima de um sistema de trabalho análogo à escravidão. Mas, como Mateus aprende com o tempo, até seu patrão tem um patrão. Se ele quiser encontrar uma saída, até onde ele deverá ir o que deverá se tornar?
O que achamos:
O caminho de 7 Prisioneiros para levar o Brasil para o mundo tem sido um bem interessante. O longa fez sua pré-estreia em dois festivais internacionais muito importantes e apenas comprova que o nosso país realmente tem boas produções e que realmente precisam ser valorizadas.
E aqui, liderados pelo extremamente talentoso Christian Malheiros (depois de Socrates e da série Sintonia), 7 Prisioneiros faz um filme que impressiona. Seja pela intensidade da história, pela brutalidade do tema envolvido, ou até mesmo, pelas atuações que realmente chamam atenção. Malheiros realmente se entrega no papel como o jovem Mateus e realmente faz um protagonista que tenta a todo custo não se deixar levar pelo destino e busca ele mesmo uma saída para situação perigosa que seu personagem se vê envolvido. E juntamente com Santoro, que se mostra novamente um ator super habilidoso e que está pronto para mudar fisicamente em cada novo filme, a dupla faz de 7 Prisioneiros um dos filmes mais interessantes que passou pelo Festival de Toronto.
A história de pessoas sendo traficadas parece ser uma distante que vemos apenas nos jornais e que só acontecem longe daqui como por exemplo na Europa Oriental, na Rússia, ou na Ásia, mas a história de Mateus é uma que acontece aqui perto, em São Paulo mesmo, onde a oportunidade de empregos e de uma vida melhor sempre foi um chamativo para muitas pessoas. E a chegada do jovem, e de outros rapazes, em busca de trabalho se mostra uma mais perigosa que ele jamais imaginaria.
O interessante é que o roteiro de Thayná Mantesso e Alexandre Moratto (e em seu segundo longa depois de sua estreia em Socrates também com Malheiros) jamais pintam Mateus como uma pessoa ignorante, apenas uma pessoa simples e ingênua que cai no conto e na promessa de dinheiro em troca de trabalho. E não só ele, um grupo de jovens parte para a capital para trabalhar no ferro velho liderado por Luca (Santoro, ótimo e uma caracterização de chocar), aqui chamado de Seu Luca pelos funcionários.
O que Mateus e os outros jovens não sabem que eles agora fazem parte do “quadro de funcionários” do local, mesmo que precisam pagar pelos custos de transporte da vinda para a cidade, pela acomodação caindo aos pedaços, e já chegam no lugar com uma dívida que é basicamente impossível de se pagar. Já ameaçados, sem acesso aos seus documentos, ou seus celulares os jovens precisam apenas trabalhar no local com a retirada de cobre e outros trabalhos braçais em péssimas condições e sem uma esperança de quando estar em liberdade novamente. E se algum dia estarão livres.
O texto de 7 Prisioneiros trabalha de uma forma que o espectador se vê envolvido com esses personagens, suas histórias de origem, suas motivações para estarem lá, e tudo mais, e nos coloca para pensar como esses rapazes podem sair de lá na mesma forma que eles pensam em suas opções. É parte filme de sobrevivência, onde a câmera está ali com eles naquele cômodo pequeno em eles planejam a cada momento uma forma de sair de lá, é parte um suspense caótico na medida que vemos os jovens maquinarem os planos e suas opções (eles vão matar todo mundo? eles vão esperar alguma oportunidade para fugir?), é parte um longa de amadurecimento na medida que vemos esses rapazes empenhados a fazer o trabalho acontecer para realizarem seus sonhos (alguns querem casar, outros cursar a faculdade) e terem vidas melhores.
Mas o que acontece, quando os dias se tornam semanas, e as semanas meses e a fuga se torna cada vez mais difícil? A ideia do grupo estar junto, e liderados por Mateus que se destaca com o grande cabeça, para tentar combinarem suas forças, até dá certo e um determinado momento, mas na medida que Isaque (Lucas Oranmian), Ezequiel (Vitor Julian) e o restante dos rapazes começam a se estranharem, Mateus percebe que a única chance deles saírem de lá é tentarem algum tipo de acordo com Luca.
O longa sempre faz como se Mateus tivesse um grande plano na cabeça e tentasse ser mais esperto que Luca, o que, novamente, na ingenuidade, o jovem acha que poderia dar certo, mesmo que isso seja apenas o começo, de uma nova etapa na vida do rapaz.
E7 Prisioneiros trabalha isso da forma mais realista possível. É tudo muito palpável que poderia realmente acontecer na vida real. Desde dos possíveis pedidos de ajuda para a polícia local que está dentro do esquema de corrupção, passando pelo bar da esquina que faz vista grossa para o que acontece, e até mesmo pela batida que o Ministério do Trabalho dá no local e que garante uma das cenas mais intensas do filme, na medida que Mateus fica cara a cara com os agentes e tem a possibilidade de contar tudo aquilo que acontece. E é como ele mesmo diz: “O que aconteceria depois?”, afinal, os garotos nessa altura do filme já estão em ritmo de escravidão e com suas famílias ameaçadas pela organização de Luca.
A grande pergunta que 7 Prisioneiros se faz é: quem realmente se beneficia com isso? O cara representado por Santoro que está ali ganhando um trocado e de olho nos meninos, ou alguém maior, e que realmente fica de fora dos holofotes? O grande esquema só continua em pé pois tem alguém para comandar e alguém para trabalhar. Assim, em seus momentos finais, vemos essas perguntas todas se chocarem com as decisões que Mateus toma na medida que o jovem prisioneiro e o seu “chefe” adentram no dia-a-dia da organização e mostram como funciona o esquema que ele se viu envolvido. Agora para a Mateus é o famoso matar ou morrer na esperança de que em algum momentos as coisas vão dar certo para eles. Mas o que fazer quando, no final, ele se vê mais envolvido com a organização do que imaginava?
7 Prisioneiros chega na Netflix em Novembro.
Visto em sessão digital da edição 2021 do Festival de Toronto.