Logo nos seus minutos iniciais, Persuasão (Persuasion, 2022) tem uma cena que bem define o que esperar dessa nova adaptação da obra de Jane Austen para a Netflix. Em uma das cenas Lady Russell (Nikki Amuka-Bird) diz para a nossa protagonista Anne Elliot (Dakota Johnson) a seguinte frase: “Já se passaram sete anos”, a personagem responde: “Foram oito anos” e temos o contra argumento: “Querida, em algum momento você tem que superar.”
E com isso, o tom mais moderno e debochado que a adaptação da Netflix entrega é sentido, logo de cara, nos momentos iniciais do longa. E a graça do filme fica inteira nesses pequenos momentos, afinal, a trama contada aqui nesse Persuasão é a mesma do livro da conhecida autora e que já teve diversas outras adaptações ao longos dos tempos.
Inclusive, Persuasão da Netflix não é a única que o público terá acesso nos próximos meses, uma outra com a atriz Sarah Snook (do hit Succession) está também prestes a ser lançada em algum momento. Ainda não sabemos quando, mas em breve. Mas voltando para a adaptação da Netflix, e o tema central deste texto, o que temos aqui é um longa charmoso e super embalado pelo algoritmo da plataforma depois que a Netflix viu em Bridgerton um sucesso, e agora tenta capitalizar em cima dessas histórias de romances de época. Não é algo novo em Hollywood, mas a plataforma fez essa onda voltar com força, e por isso vemos diversos projetos com esse tema pipocar por aí.
E já que estamos discutindo comparações, acho que o Persuasão da Netflix está mais para a linha que uma outra adaptação da autora, o longa Emma (lançado em 2020 com uma ótima Anya Taylor-Joy). Assim, fica claro que o longa funciona e muito por conta de Johnson que está no seu melhor momento em termos de carreira. Projeto após projeto a atriz consegue tirar aquela imagem Cinquenta Tons de Cinza que impregnou em sua persona artística, onde depois de A Filha Perdida, Cha Cha Real Smoth e Persuasão, aquele trabalho parece soar cada vez mais distante na memória.
Johnson garante que a adaptação para a Netflix seja a mais charmosa possível, seja pela quebra da quarta parede, um toque interessante e que serve para nos conectarmos com a personagem, ah lá a série Fleabag ou até mesmo com o divertido Enola Holmes, ou por seus monólogos bem inspirados na medida que a personagem conversa com o espectador. Em Persuasão, Johnson entrega uma atuação carismática e que consegue liderar um elenco nessa história de amor e de dança das cadeiras da sociedade inglesa.
E tudo parece funcionar no longa na medida em que somos apresentados para Anne, uma jovem inteligente, mas solteira, que não se prende aos costumes da época, bem diferente de seu pomposo e vaidoso pai Sr. Elliot (Richard E. Grant, ótimo e na medida certa explorado no filme), e suas irmãs malvadas, a mais velha Elizabeth (Yolanda Kettle) e a mais nova Mary (Mia McKenna-Bruce, excelente e o alívio cômico do longa). té que que rapaz retorna, depois de anos fora do país e com dinheiro e um cargo importante na Marinha inglesa, e a vida de Anne muda num piscar de olhos na medida que sua família se vê à beira da falência.
“Como pode a vida permanecer estática, quase obstinadamente resistente a qualquer mudança por anos, e depois, sem nenhum aviso, ser inundada com tantas novidades no decorrer de poucas semanas?” diz Anne em um dos monólogos que Johnson arrebenta ao longo do filme.
E assim, a história se desenrola como falamos com um grande charme de uma produção de época, com figurinos dos mais lindos, e locações rurais que ajudam a dar um tom bem característico para o longa. A diretora Carrie Cracknell abusa delas para colocar os personagens em diversas viagens ao longo do filme, onde conhecemos mais da relação de Mary com o marido Charles (Ben Bailey Smith), e seus filhos que ela parece sempre ignorar, e suas cunhadas Henrietta (Izuka Hoyle) e Louisa (Nia Towle), e como a chegada de Wentworth impacta na vida dessa família, e um possível triângulo amoroso começa a se desenvolver, onde, claro Anne se vê em dúvidas de como se comportar depois de tantos anos longe do homem que ela considera ser sua alma gêmea.
O longa entrega passagens divertidas, com a quebra da quarta parede sempre presente numa forma de Anne lidar com sua solidão, talvez, e que dão a oportunidade para apreciarmos as peripécias que são colocadas, e os obstáculos narrativos que são impostos para que um futuro relacionamento entre a personagem e Wentworth se desenvolva. Seja a chegada de um novo membro para esse complicado relacionamento na figura do Sr. Elliot (Henry Golding), um primo distante e que tem o poder de controlar a fortuna da família, ou até mesmo no incidente que envolve Louisa e que força a trama a mudar de cenário para o interior de Londres, na medida que a família se reúne novamente.
O texto escrito pela dupla Ron Bass e Alice Victoria Winslow é bem entregue por todos os atores, mas o que se destaca aqui é a química incomparável de Johnson tanto com Golding quanto com Jarvis ditam o tom que Persuasão se apresenta em termos dos casais apresentados e que torcemos na medida que o longa passa. E para completar, as escolhas visuais que a diretora Carrie Cracknell tem para diversas cenas apenas deixam essa história, dessas água com açúcar, ser melhor do que ele parece ser, e nos ajuda a cair de cabeça na trama do filme e esquecer dos problemas por algumas horinhas.
Agora isso, Dakota, olhe para a câmera e deslumbre o espectador com seu olhar acolhedor e penetrante, que vamos gravar.
Persuasão disponível na Netflix.