Os Fabelmans (The Fabelmans, 2022) segue a onda de diretores que fazem filmes sobre suas vidas e infâncias que tem sido a última tendência em Hollywood. Seja a pandemia que deixou todo mundo com uma sensação reflexiva sobre a vida, e o futuro, seja por conta de uma carreira que dá sinais que vai terminar… seja o que for, Os Fabelmans meio que serve como a coroação disso tudo, afinal, é a história de infância de um dos diretores mais aclamados e importantes dos últimos tempos: Steven Spielberg.
A importância de Spielberg para a história dos cinemas é, sem dúvidas, o que o faz ser um dos maiores contribuidores para a popularização dos filmes de Hollywood no cenário cultural mundial. Foi assim com Tubarão (1975), E.T.: O Extraterrestre (1982) e também as franquias Indiana Jones e Jurassic Park. Spielberg pode ser considerado o papai do Blockbuster moderno, hoje dominado por super-heróis, e tenta se reinventar a cada reboot ou remake produzido e lançado.
E aos longos dos anos a pergunta que ficava (pelo menos na minha cabeça) era: onde surgiu esse amor todo para o cinema? Como alguém consegue capturar nossa atenção de uma forma tão pessoal e íntima, ao mesmo tempo, que também numa escala e num escopo tão épico? Como parece que ele nos entende individualmente em um filme com um apelo tão universal? E é basicamente o que Os Fabelmans se apresenta em suas mais de 2h30 de duração.
Spielberg na medida que conta a história de sua família, aqui com os fictícios Fabelmans que dão o título para longa, entrega uma homenagem para a (sua) paixão para os filmes, o que faz a magia do cinemas entrar em nosso imaginação, e como isso pode afetar as nossas vidas, e aqui, como afetou a vida do próprio diretor.
Os Fabelmans triunfa quando foca nesses momentos focados intensamente na curiosidade e na empolgação do jovem Sammy Fabelman (Gabriel LaBelle, ótimo na versão adolescente do personagem) sobre como acontecem as cenas de ação, em especial um acidente de trem visto no longa O maior espetáculo da Terra (1952), que ele assistiu nos cinemas com os pais quando era menor. Isso afetou a visão de mundo do garotinho (no começo do longa interpretado pelo ator mirim Mateo Zoryan) e como essa fascinação pelo que foi visto na telona moldou o caráter do garoto ao longo dos próximos anos.
Claro, esse gosto pelas artes cinematográficas ditam o tom para Os Fabelmans, mesmo que o filme tenha uma boa parcela de sua narrativa focada nos dramas familiares que essa família judia vivia e os seus percalços ao longos dos anos. A relação dos pais, Burt (Paul Dano) e Mitizi (Michelle Williams, fantástica), que não poderiam ser mais diferentes, ele mais centrado e calmo, e ela mais artística, avoada e sonhadora, a relação entre as crianças, entrei si, e com os pais, e depois lá para a metade do filme, a relação de Sammy com os colegas de ensino médio, os valentões do colégio, e a primeira paixão.
Essas passagens mescladas com os momentos que Sammy trabalha com seus filmes, e usa as câmeras para criar pequenos curtas e histórias com os amigos, se unem no filme para ajudar Spielberg a contar essa sua história para os olhos dos espectador e como sua jornada para se tornar um diretor se deu, com o contexto de vida que ele vivia, e as tomadas de decisões que o ajudaram a moldar esse caminho para essa profissão.
As cenas das filmagens caseiras com as irmãs como múmias de papel higiênico, as gravações do longa de guerra com os amigos escoteiros, e até mesmo a viagem de formatura com a namoradinha do colégio, se mostram as melhores partes de Os Fabelmans, e se entrelaçam com os dramas que se desenvolvem por consequência das filmagens que Sammy faz da família durante a viagem para acamparem com o melhor amigo dos pais do jovem, o amalucado Bennie (Seth Rogen).
Os Fabelmans tem momentos, onde o texto escrito também por Spielberg e Tony Kushner, nos agraceia com piadas bem humoradas, e outras com passagens tristes e que mostram que nem tudo são flores. Muitas delas são protagonizadas por Williams que realmente se destaca em toda cena que aparece, em uma das suas melhores atuações dos últimos tempos. Williams garante que a trama se movimente e sua personagem dá uma salpicada na trama que deixa Os Fabelmans praticamente com uma visão única sobre a família e conflitos familiares.
É como se o espectador fosse jogado para essas memórias, onde, talvez, as coisas não acontecerem exatamente daquele jeito, mas fica claro que ficaram marcadas na memória do diretor que entrega uma quase com perfeição (tanto visual, quanto textual) essas cenas familiares, onde as coisas positivas são extremamente positivas e as negativas soam como o maior desastre do mundo, assim como o trem que descarrila em tela e impressiona o jovem garotinho sentado entre mamãe e papai numa sala escura.
No final, o que temos com Os Fabelmans é a história da realização do que é chamado de um hobby pelo pai para se transformar em uma profissão real e que nos levou para o início de uma das maiores carreiras em Hollywood. Ao olhar para dentro, Spielberg entrega um de seus maiores filmes, onde não foi preciso animais aquáticos ferozes, criaturas de outro mundo, ou um arqueólogo viciado em adrenalina, e sim, olhar para tudo que aconteceu com ele, como pessoa, e não alguma coisa 100% inventada.
Onde assistir Os Fabelmans?
Os Fabelmans está em cartaz nos cinemas nacionais.