A trajetória de Meu Pai (The Father, 2020) foi longa até abocanhar suas 6 indicações ao Oscar no mês passado. Exibido no Festival de Sundance em 2020, o filme do diretor francês Florian Zeller (indicado ao Oscar na categoria de Melhor Direção) foi um dos grandes destaques e um dos filmes que marcou o evento ainda numa Era Pré-Pandemia. As atuações de seu elenco principal, os atores Anthony Hopkins e Olivia Colman, eram um dos assuntos mais falados quando tínhamos matérias sobre o que de bacana e de novidades o festival tinha trazido naquele ano, e claro o longa já naquele começo de ano, iniciava sua companhia para a temporada de premiações bem forte, e mesmo não tendo estreado no chamado Trio de Ouro (Cannes, Veneza e Toronto) da temporada de premiação, já despontava como um filme para se ficar de olho.
Coisa que nós do Arroba Nerd fizemos. Aí veio a pandemia e parece que Meu Pai ficou esquecido, assim como as memórias do nosso protagonista, até ressurgir no final do ano. E é realmente na força das atuações de Hopkins e Colman (ambos indicados em Melhor Ator e Melhor Atriz Coadjuvante, respectivamente) que Meu Pai (indicado ao Oscar de Melhor Filme) se destaca e mostra o motivo na qual esse excelente filme e mereceu todas as suas indicações.
Com um tom melancólico e um ar de tristeza de partir o coração, Meu Pai se mostra em sua narrativa devastadora o poder dessa doença, das memórias, e o final do amor pela vida e pelos momentos mais marcantes que compuseram a jornada do senhor inglês Anthony (Hopkins) por aqui. Meu Pai joga o espectador dentro da cabeça do protagonista, e para aquelas salas que parecem ser as mesmas, mas são completamente diferentes, se olharmos de perto, para contar essa história. O filme é simples, se passa basicamente dentro do apartamento que Anthony vive, e acha que é o seu, mas a forma com que Zeller conta essa história (além da direção ele também cuidou do roteiro), o poder da narrativa criada por ele e como ela vai e volta nas lembranças e nos fragmentos da fraca mente de Anthony é um trabalho fenomenal de construção cinematográfica. Um que não precisa de efeitos visuais de última ponta, e sim de pequenos detalhes sutis, como a mudança de um figurino, uma alteração na decoração do set, para contar essa história.
Meu Pai entrega um filme sem muitas firulas e realmente por isso o deixa ser tão grandioso no que acaba por nos entregar. Baseada na peça de mesma autoria do próprio Zellar, Meu Pai é como se estivéssemos no melhor local do teatro, no camarote com a vista mais privilegiada para vermos, acompanhar, e nos emocionarmos com o que é visto e mostrado em tela. Zellar faz o uso do tempo de uma forma tão incrivelmente bem feita, que deixa o longa de ficção científica de Christopher Nolan, Tenet no chinelo. Ao jogar os personagens, e a nós, os espectadores, nessa jornada dentro da mente, Zellar prega diversas peças ao longo do filme sobre o que é real, o que é a doença atacando, o que é um mero lapso de memória, e o que é a mente protegendo o nosso protagonista de eventos traumáticos que aconteceram em sua vida. Seja uma infância difícil, a morte de um parente, ou no caso, o esquecimento de onde está um mero relógio, Meu Pai nos joga para o que realmente aconteceu sem seguir um caminho cronologicamente correto para a ordem que os eventos aconteceram.
E assim, paralelamente ao que acontece com a mente do protagonista, Meu Pai usa a narrativa fragmentada e confusa para nos mostrar como a mente já falha de Anthony não segura informações básicas como se é noite ou dia, ou quem é a pessoa que ele conheceu ontem, e etc. E tudo isso é contado com a ajuda das realmente intensas atuações de Colman (vindo de uma trajetória incrível de projetos nos últimos anos) como Anne, a filha de Anthony que decide ir para Paris com o novo marido, e precisa decidir colocar o pai em um asilo, depois de algum tempo dele morando no seu apartamento. E de Hopkins que realmente se entrega de uma forma completamente intensa e angustiante de se assistir. Hopkins consegue navegar por essa história de uma forma tão interessante, com um personagem tão bem construído, e que nos impacta de uma forma tão impressionante é que impossível não sair com os olhos mareados em diversas cenas.
Duas passagens que realmente me marcaram em Meu Pai foram quando o personagem toma consciência do que realmente está acontecendo e que Hopkins preenche a tela numa atuação tão grandiosa como seus outros papéis que lhe deram fama. Aqui, Hopkins está no seu auge, mesmo que a seu personagem esteja no seu pior momento.
No final, Meu Pai entrega um filme que acaba por ser um dos mais bonitos e impactantes dessa temporada de premiações marcada pela dor de uma pandemia e como ela nos afetou diretamente e indiretamente. Meu Pai entrega na sua narrativa comovente um filme para ficar marcado neste ano atípico e que ganhou fôlego por aquilo que importa conseguir contar uma boa, mesmo que melancólica história. Um filme indispensável na lista de maratonas deste ano.
Meu Pai estará disponível nas plataformas digitais nacionais em 8 de abril e a California Filmes não dispensa um lançamento nos cinemas assim que possível por conta da pandemia.
O filme foi visto em uma sessão virtual para a imprensa.
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