Um dos mais reconhecidos méritos do FILE (Festival Internacional de Linguagem Eletrônica), que estreia no Centro Cultural Fiesp no dia 4 de julho, é sua capacidade de reunir obras de artistas que utilizam, com criatividade e pioneirismo, plataformas tecnológicas para construírem poéticas que exploram os limites entre os mundos real e virtual e produzem sensações inusitadas. Considerado o mais importante evento de arte eletrônica da América Latina, o festival fica em cartaz até 12 de agosto, com entrada gratuita.
Em seu 19º ano, o FILE aborda o paradoxo entre o físico e o virtual, representados pelo corpo e por realidades e sensações criadas por meio do uso da tecnologia. As possibilidades criadas a partir dessa simbiose formam o fio condutor da mostra, que faz, nesta edição, uma alusão a célebre frase de Marshall McLuhan, “O meio é a mensagem“, e adota como tema central “O corpo é a mensagem“.
De acordo com os idealizadores e organizadores do FILE Ricardo Barreto e Paula Perissinotto, “os artistas têm se apropriado, cada vez mais, das tecnologias geralmente usadas por outras disciplinas, como a medicina e a biologia. Por outro lado, do ponto de vista externo, o corpo humano vem enfrentando reações, paradoxos e alteridades no uso das tecnologias em óculos 3D, em que o corpo convive com duas realidades simultaneamente: a física e a virtual. Chamamos esta fusão de realidade mixada“.
Outrospecter é um exemplo emblemático dessa tendência. A obra dos holandeses Frank Kolkman e Juuke Schoorl permite experimentar a sensação de flutuar fora do próprio corpo, situação que a ciência vem pesquisando em pacientes que se encontram no chamado “estado de quase morte“. Com o uso da realidade virtual, o projeto investiga questões não respondidas sobre a mortalidade e o fim da vida.
Além dela, são diversas as instalações que remetem à frase tema da exposição. “SyncDon II“, dos japoneses Akihito Ito e Issey Takahashi, por exemplo, induz a sincronização do batimento cardíaco de um usuário com o batimento de outro participante por meio de estímulos auditivos, táteis e visuais. A sincronização remete à comunicação humana primitiva, baseada em emoções e no ritmo circadiano.
Segundo Débora Viana, Gerente Executiva do Centro Cultural Fiesp, o FILE já se tornou um dos eventos mais aguardados do ano. “Cada edição é uma oportunidade única para o público entrar em contato com o que há de mais inovador no campo da tecnologia aliada à produção artística, não só do Brasil, como do mundo todo. É uma exposição para pessoas de todas as idades“, afirma.
Ao todo, o FILE 2018 reunirá mais de 240 trabalhos de artistas de 38 países – incluindo as instalações que ocuparão a Galeria de Arte do Centro Cultural Fiesp –, o FILE LED SHOW, projetado na Galeria de Arte Digital, instalada na fachada do prédio, e o FILE Online, nas categorias Animação, Games, Gif, Soudart, Videoart, Web e VR Quadros (acesso pelo site file.org.br).
Muitas das obras são interativas, já outras convidam à observação e à reflexão. Todos os trabalhos, porém, têm em comum um caráter instigador e inovador. Diferentemente de outras exposições em que o público aprecia as obras, o FILE precisa ser experimentado, sentido, explorado. E incitado pela magia da mistura da realidade física e virtual e da relação entre o corpo e a tecnologia, cada visitante acaba criando a sua própria realidade.
DESTAQUES
Com ineditismo e originalidade, Outrospecter, dos artistas holandeses Frank Kolkman e Juuke Shoori, é uma instalação que funde três realidades simultaneamente: a física, a virtual e a robótica. Na obra, é possível provar da sensação de estar fora do próprio corpo. Há um deslocamento espaço-psicológico da própria existência em um mundo multidimensional.
Do alemão Peter William Holden, as obras Vicious Circle (Círculo Vicioso) e Arabesque são instalações coreográficas inspiradas nos dois possíveis fins da robótica: a guerra e a paz. O visitante poderá ver a dança de fragmentos de corpos robóticos sob a música bélica e marcial inspirada em A Dança dos Cavaleiros, do compositor russo Serguei Prokofiev, ou sob o compasso ternário das valsas de Johann Strauss, em um prazeroso sentido circular.
Unlimited Corridor (Corredor Infinito), do japonês Keigo Matsumoto, permite que os visitantes vivenciem uma situação inédita e paradoxal entre a realidade física e a virtual, em que se caminha em um espaço circular guiado pelo tato, mas se tem a sensação de andar em um corredor reto, estreito e infinito.
Objective Realities (Realidades Objetivas), criada pelo projeto coletivo de design e pesquisa automato.farm, baseado em Xangai e formado por Simone Rebaudengo, Matthieu Cherubini, Asad Datta e Lorenzo Romagnoli, é uma experiência em realidade virtual que muda a perspectiva de um ponto de vista do corpo humano para a do corpo de um objeto. Aqui, pessoas assumem uma vida centrada no objeto e interagem entre si dentro de uma mesma casa virtual. Depois de “vestir-se” um dos objetos, o participante pode varrer o chão como um robô de limpeza, soprar coisas na casa como um ventilador ou passar de uma tomada para outra por fios elétricos. Este trabalho foi inspirado nas obras do escritor de ficção científica, Bruce Sterling.
Outro experimento de realidade virtual (VR) é The New Body (O Corpo Novo), criado pelo Estúdio APVIS, da Holanda, no qual o animador Demian Albers e o artista Jack Timmermans estudam a dança de uma forma disruptiva (que rompe com os padrões e tecnologias já estabelecidos). Nesta obra, ao contrário do que dançarinos de todo o mundo fazem, o público pode modificar um corpo humano virtual para assim construir uma nova coreografia. Dessa forma há uma inversão inédita e radical, já que não se trata de fazer uma coreografia para o corpo dos bailarinos.
FILE LED SHOW 2018
A Galeria de Arte Digital do Centro Cultural Fiesp, plataforma de LED de 3.700 m² instalada na fachada do prédio da Fiesp e do Sesi, recebe uma programação especial, das 19h às 6h. Com curadoria de Fernanda Almeida, o FILE LED Show 2018 apresenta a mostra “Combate e colaboração”, que visa compreender a relação humana com os diversos programas existentes. Serão exibidas seis obras que abordam questões que permeiam sistemas digitais, tais como suas estruturas subjacentes e a capacidade de produzir padrões, variações e restaurações. A autonomia desses sistemas pode ser compreendida como metáfora para a liberdade de ação relativa aos diversos aparelhos e programas técnicos, políticos e culturais. Destaque para as obras brasileirasLugares do Invisível (Anna’s Hummingbird), de Lucas Morais, e Float (Flutuar), de Frê Vidovix.
A exposição apresenta ainda outras três mostras na Galeria de Arte Digital, frutos de parcerias com centros internacionais de formação de jovens artistas: o Departamento de Artes Digitais do Instituto Pratt, de Nova York, a Universidade Americana de Sharjah e a Universidade de Nova York Abu Dhabi. Ao todo, as quatro mostras reúnem 25 obras de artistas do Brasil e do exterior.
Dentro da Galeria de Arte do Centro Cultural Fiesp, o FILE LED Show 2018 também exibe um apanhado do seu arquivo de videoarte, com obras das três últimas edições, em uma instalação produzida por Felix Beck e Barkin Simsek, da Universidade de Nova York Abu Dhabi.
Para mais informações sobre a programação completa, acesse o site www.centroculturalfiesp.com.br.