A nova empreitada do Prime Video em produções nacionais fica com o seriado Desjuntados que chegou com sua primeira temporada na plataforma. A sinopse realmente é simples e, bem, simples é o que define basicamente quase tudo que você precisa saber com a produção: Desajustados apresenta a história de um casal separado que, afogado em dívidas, é forçado a morar no mesmo apartamento na Barra e a aprender a viver nessa nova etapa do relacionamento deles.
E colocar duas pessoas que tem mais diferenças do que similaridades será que dá certo?
Particularmente não cai de amores pela produção, mas pontuo aqui que o maior destaque realmente fica com a presença da dupla de protagonistas que realmente segura as pontas e garante uma agradabilidade em tela muito interessante. Sem eles, sem sombra de dúvidas, essa passagem pelo edifício Ocean Waves, por mais bem estilizada com um visual retrô, e engraçadinha, e cheia de filtros, não iria colar. Desjuntados coloca então a hilária Letícia Lima (Porta dos Fundos, Vai que Cola e outras produções nacionais) para contracenar com o competente Gabriel Godoy (O Negócio, Me Chama de Bruna). e os dois atores fazem uma combinação ideal em tela, assim como digital e porta biométrica que dá acesso aos lugares do grandioso condomínio que os personagens dos dois moram no Rio de Janeiro e precisam lutar contra unhas e dentes para salvar.
Lima e Godoy conseguem, no meio do texto mais exagerado e carregado, mostrar que a graça pode vir de pequenas cenas, onde trabalho de expressão corporal aqui é muito mais importante do que realmente um texto que dê para eles liberdades criativas para improvisar e tudo mais. Juntos em cena, a dupla de atores se destaca com uma relação de amor e ódio (e um toque de indiferença) que diverte, e desjuntados, ao atuarem sozinhos e com outros parceiros de cena, também funcionam muito bem, onde definitivamente, Lima e Godoy carregam e elevam a produção.
Em termos de produção, Desjuntados talvez deixe a desejar. Tudo acaba por ser muito simples e realmente parece que estamos vendo um teatro gravado e exibido na TV, só que aqui no streaming. Por mais que tenhamos diversas locações, quase tudo se resume a se passar no tal apartamento cobiçado que a dupla precisa fazer de tudo para manter. A série foi gravada durante a pandemia, e então, talvez, tenhamos aqui a resposta. Claro, o trabalho estético de criação das passagens de cena, ou até mesmo de sonorização ajuda a dar uma boa maquiagem, mas como falamos, em certas cenas é como se estivéssemos vendo os personagens em um palco em suas marcações e suas falas sendo ditas.
Já em termos de história, as peripécias que os personagens de Lima, Camila a vendedora de uma empresa de multinível de beleza e a única fonte de renda do casal para sobreviverem ao caos e as dívidas, e Caco (Godoy), um engenheiro químico que é despedido de uma grande empresa petroquímica e espera receber os valores de uma indenização que nunca vem, chegam até serem divertidas em alguns momentos, já em outros temos passagens totalmente constrangedoras, onde parece que Desjuntados nunca sabe se quer mostrar os desdobramentos do plot principal como eles se dariam na vida real ou fazer uma sátira dos mesmos eventos que são realmente muito surreais.
É como se o texto de Dani Valente e Mina Nercessian colocassem uma lupa em todos os pontos mais polêmicos dessas pessoas que realmente são arquétipos e personificações da famosa classe média carioca, onde Desjuntados tem um pé mais novelesco e juntamente com seu outro, já falado, teatral. É como se os episódios fossem também uma grande sequência de esquetes de humor que, mesmo que funcionem por 5, 8 minutos, falham em realmente contar uma história serializada propriamente dito.
Ao tentar inovar, Desjuntados não parece que caminho quer seguir. É como se o espectador pudesse dar o play em boa parte deles de forma isolada e que conseguiria acompanhar a trama tranquilamente. Nessas pequenas passagens que o time de produção consegue contar algumas cenas que valem a pena, seja uma que vemos Camila pular a janela, e invadir a academia trancada e topando com um vizinho, ou quando ela tenta fechar uma parceria para se tornar blogueira fitness, ou uma empreitada desastrosa de Caco com uma empresa de churrasco que claro não dá certo, ou até mesmo o episódio em que o personagem precisa decidir se vende um quatro caríssimo que está na família há anos. E por mais que essas histórinhas garantam algumas risadas, pouco se conectam entre si para realmente contar essa história propriamente dita.
E por mais que essas passagens garantam algumas risadas, pouco se conectam entre si para realmente contar essa história propriamente dito. Nem mesmo quando Camila e Caco, mesmo morando juntos, partem para novas relações, e a série troca o casal de “amigos” e vizinhos fofoqueiros Guilherme (Marcelo Laham) e Ana (Letícia Isnard, ótima aqui com suas falas que misturam o português com o inglês) pelos novos respectivos novos companheiros deles como Roberto Carlos (Romulo Arantes Neto) e Joana (Virginia Cavendish, numa boa participação) a série consegue decolar. E boa parte dos outros personagens, como os melhores amigos Paty (Danni Suzuki) e Marcinho (Yuri Marçal, hilário) ficam extremamente a mercê do tempo de tela dos protagonistas, e aqui apenas existem para orbitar seus colegas, do que realmente tentarem uma história a ser contada.
Com o uso do recurso de flashbacks para nos posicionar em quais momentos da trama e da relação do casal estamos, e com um ótimo trabalho de personagens de Lima e Godoy, sem dúvida nenhuma, Desjuntados tem poucos momentos que fazem a produção valer seu play. Mesmo que a série seja uma no meio de tantas opções, tantas ofertas tanto dentro do streaming, quanto fora dele, é como se Desjuntados ficasse perdido no meio disso tudo. É como se o chamássemos o elevador do Ocean Waves que nunca chega no andar certo para fazer essa história engrenar de verdade.
Desjuntados tem sua 1ª temporada disponível no Prime Video.