quinta-feira, 26 dezembro, 2024
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Histórico Criminal | Crítica: 2 policiais num intenso jogo de gato e rato

Ter atores que dão conta do recado e que elevam o material apresentado talvez seja um dos grandes triunfos que uma produção possa ter. E esse é o caso aqui da série Criminal Record (Histórico Criminal no catálogo brasileiro do AppleTV+). A atração é estrelada pelos atores Cush Jumbo, mais conhecida pelos fãs das séries jurídicas The Good Wife/The Good Fight e por Peter Capaldi, o eterno Doctor Who e que de uns tempos para cá tem pego papéis mais intensos em produções mais sombrias sendo que uma delas, a série The Devil’s Hour, foi indicada ao Emmy internacional. 

Peter Capaldi e Cush Jumbo em cena da série Histórico Criminal.
Foto: Courtesy of Apple.

E por mais que seja uma combinação inusitada, de atores que caminhavam suas carreiras com projetos diferentes, aqui eles se unem para essa atração policial, se dão muito bem nela e realmente são o principal fator que fazem Histórico Criminal dar certo. Ajuda o fato que a dupla também esteja na produção executiva, o que faz deles conhecedores ainda mais profundos de seus personagens, da história que eles querem contar, e a forma como eles querem contar.

E por se passar nos dias atuais, o roteirista Paul Rutman consegue fazer com que Histórico Criminal faça um paralelo gigante com uma Londres moderna e com problemas estruturais de uma sociedade que infelizmente existem em toda a parte do mundo. As peculiaridades do sistema policial inglês dão o tom para deixar a atração com um forte toque forte, mas que entrega uma história com apelo global, sem dúvidas.

E tudo isso é capitalizado pela atuação de Jumbo como a policial June Lenker e de Capaldi como o detetive chefe de investigação Daniel Hegarty, onde a dupla é cerne, o coração e a alma de Histórico Criminal. Os personagens estão em momentos diferentes de carreira e essa diferença não só é de cargos, mas de momentos de vida, de passados, de experiências que são amplificados na medida que June recebe um novo caso e que parece se conectar com um caso antigo que o lendário policial Hegarty tocou e liderou alguns anos atrás.

Uma ligação anônima é o estopim para entrarmos de cabeça no sistema judicial inglês na medida que ambos os lados têm muito o que provar, cada um de sua própria maneira que são esmiuçadas na medida que o seriado se desenrola. June precisa galgar seu lugar no departamento de polícia, e ainda lidar com o fato que é uma das poucas detetives negras na divisão, e Hegarty proteger o seu legado que foi construído ao longo dos anos. 

Histórico Criminal não perde tempo, logo no seu início, e já coloca esses dois personagens no meio de diversas investigações, onde a tenacidade e a determinação de June em conseguir conectar as pistas que vieram da tal ligação (vinda de um telefone público, com palavras em outro idioma, e com uma qualidade de som horrível) é contada em paralelo com a trama do detetive Hegarty que está de olho em tudo em tentar encobrir os acontecimentos do passado.

Assim, precisamos descobrir, junto com a personagem de Jumbo, o que realmente aconteceu, se June está realmente falando a verdade, e como o personagem do policial veterano e os outros envolvidos no caso que é desenterrado, estavam envolvidos nisso tudo. 

Na medida que a série apresenta as entranhas da instituição policial, a forma como os policiais dão um jeitinho em alguns casos cercados de corrupção, Histórico Criminal ainda mostra essa disputa de poder que June e Hegarty disputam na medida que o fio desse grande novelo de lã é puxado.

Aysha Kala e Cush Jumbo em cena da série Histórico Criminal.
Foto: Courtesy of Apple.

Os episódios são intensos e realmente não poupam esforços em mostrar a realidade, e como a realidade é diferente para ambos os personagens, e aqueles que eles se relacionam. Histórico Criminal foca no caso policial e conta essa história pelo prisma de questões sociais e raciais. A dualidade entre os dois protagonistas é desenvolvida aos poucos na medida que vamos conhecendo mais do passado, e da vida pessoal, desses dois policiais. 

A parte mais interessante é que Histórico Criminal nunca rotula seus personagens e nunca assume que eles são figuras opacas e unidimensionais e sim personagens humanos e complexos e que vamos a cada episódio ver as artimanhas e jogadas que cada um faz para tentar desvendar (ou abafar) esse caso.

E ao mesmo tempo, nós os espectadores, vamos por descobrir mais sobre caso do jovem Errol Mathis (Tom Moutchi), o que aconteceu de verdade, como ele foi parar atrás das grades pelo crime de matar a companheira Adelaide Burrowes (Ema Cavolli), mesmo ele alegando não ter cometido esse crime lá no passado e sua mãe Doris (
Cathy Tyson)
tentando provar sua inocência anos depois.

O foco é a investigação dos casos de Burrowes e Mathis, mas Histórico Criminal é mais do que uma simples série policial com essa trama de assassinato, e sim uma atração que lida com assuntos complexos como questões de racismo, o estrutural e o velado, de uma forma extremamente real de se acompanhar e dão mais uma camada para a série.

Da relação de June com o marido Leo (Stephen Campbell Moore), um psicólogo, com o filho Jacob (Jordan A. Nash), e a mãe Maurren (Zoë Wanamaker) que sofre uma doença menta, até mesmo de Hegarty com a filha Lisa (Maisie Ayres), viciada em drogas, e também com Patrick (Rasaq Kukoyi) o filho já crescido de Adelaide e uma das poucas testemunhas do caso, o seriado vai por nos guiar em mostrar a complexidade desses personagens, das decisões que eles tomam e como isso os afetam. 

Na medida que June e a investigadora particular Sonya (Aysha Kala) começam a chegar perto da verdade, Hegarty e toda a rede que colegas que o ajudaram começam a se coçar para continuar a deixar os acontecimentos do passado enterrados.

Como uma boa série de streaming, a atração só cresce e a trama vai por caminhos dos mais imprevisíveis possíveis na medida que novas informações são apresentadas pelos personagens tanto para eles mesmos e entre eles quanto para nós, a audiência. O combo inicial, 1×01- Emergency Caller e 1×02 – Two Calls, lançados de uma vez, servem para contextualizar o espectador na trama e com os personagens. A série ganha viradas boas na trama nos próximos capítulos com o 1×04 – Proteced e o pesado 1×05 – Possession with Intent que são alguns dos melhores episódios da atração. O 1×07 – The Sixty-Twos amarra todas as pontas para entregar o explosivo final de temporada 1×08 – Carla. 

No final, Histórico Criminal se apoia nesses personagens para fazer a trama girar e entrega uma atração extremamente viciante de se assistir. É pesada, é brutal, mas não faz nada gratuitamente, e sim acaba por ser como um espelho da nossa sociedade, e mostra como, às vezes, as coisas podem se perder no meio de tecnicalidades do sistema jurídico e policial. 

Histórico Criminal exibe novos episódios todas as quartas-feiras no AppleTV+.


Miguel Morales
Miguel Moraleshttp://www.arrobanerd.com.br
Sempre posso ser visto lá no Twitter, onde falo sobre o que acontece na TV aberta, nas séries, no cinema, e claro outras besteiras.  Segue lá: twitter.com/mpmorales

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