Você quer saber se On The Rocks (2020) vale a pena? Eu poderia ver Rashida Jones e Bill Murray de conversa e dividindo uma taça de sorvete por horas. É isso.
Sim, On The Rocks faz um adorável filme, uma comédia que nos entrega uma produção afiada sobre a relação pai e filha em uma Nova York cada vez mais caótica. O roteiro de Sofia Coppola é bem escrito, debochado e faz um olhar incrivelmente delicioso sobre envelhecimento, casamento e monogamia.
Sempre vimos filmes sobre um homem, normalmente branco e heterosexual, ter suas crises de meia idade e passar por situações das mais malucas possíveis, não é mesmo? Mas aqui Sofia Coppola pega agora uma mulher, e que por mais surpreendente que seja, uma atriz não caucasiana, para contar a história de Laura (Rashida Jones, incrível), uma escritora que começa a suspeitar que seu marido esteja tendo um caso. E On The Rocks faz uma história sobre o depois do felizes para sempre, como vemos logo no começo quando nossa protagonista se casa, onde temos Laura, anos depois, já vivendo sua vida da forma mais comum possível, ao cuidar de duas crianças pequenas, conciliar seus horários com atividades extracurriculares, viagens, depósitos de segurança e etc. Assim, Laura vive por se perguntar o que tem de errado com ela, e seu relacionamento, afinal, não sabe para onde a espontaneidade e o romance com seu marido Dean (Marlon Wayans) foi parar.
A cena onde vemos Laura deitada na cama estirada, e a câmera foca nela com os olhos colados no teto, pensativa e exausta depois de um dia de trabalho é a definição máxima desse sentimento, ou estado de espírito, que Sofia Coppola quer passar em On The Rocks, onde também é responsável pela direção, e que acerta de uma forma incrível na criação dessa personagem com suas angustias e surtos.
E talvez, Coppola faça seu filme mais humano e realista, mais intenso ao tratar dos sentimentos femininos da mulher moderna, e temas universais como amor, solidão e a busca por uma conexão com o próximo seja ela amorosa ou não. On The Rocks está no mesmo estilo de Encontros e Desencontros (2003) e é bem mais interessante narrativamente do que Bling Ring: A Gangue de Hollywood (2013).
A Laura de Jones, tenta ser a mãe perfeita, a mulher perfeita em uma Nova York, que também parece ser uma personagem do longa, que durante o dia é cercada de carrinhos de bebê, mães atarefadas, crianças chorando, e também, pela noite com sua vida noturna, restaurantes e baladas. E meio que funciona como um contraponto da vida que Laura teve e agora tem. E é aqui que entra o personagem de Bill Murray, o bon-vivant Felix, o pai de Laura que chega para movimentar a vida da filha e seu relacionamento.
Como falamos, Laura suspeita que Dean tem um caso, e sua aposta para quem é a amante do marido, está na colega de trabalho dele, Fifi, quer dizer Fiona (Jessica Henwick). E assim, Coppola vai por mostrar todas as possíveis pistas que a fazem maturar essa dúvida que cresce intensamente, tanto na cabeça da mulher, quanto de nós espectador. Afinal, Felix, um garanhão inveterado, é craque no assunto e sabe de todos os macetes sobre como trair uma mulher e afirma categoricamente que Dean está traindo a filha. É divertido acompanhar Felix dar um toque em Laura sobre as evidências que o marido deixa por aí, para depois vermos as situações acontecerem logo em seguida de uma forma completamente oposta do que o personagem de Murray disse. E o ator faz um personagem divertido, irritante e daqueles típico paizão sabe? O Felix de Murray faz piadas fora de hora e entrega momentos embaraçosos, com visões para lá de arcaicas sobre as mulheres e tudo mais. Mas poxa a química de Jones e Murray juntos é inigualável boa, em On The Rocks eles entregam uma das duplas mais surpreendentes e mais inesperadas dos últimos anos.
Mas claro que as coisas não descem redondo o tempo todo em On The Rocks. Eu acho que quando o longa deixa Nova York, e coloca Laura e Felix rumo ao México, é que On The Rocks perde um pouco a mão e me lembra muito a comédia pastelão Desperados da Netflix. Mas ao mesmo tempo, todas as sequências de evento escarram sentimentos guardados entre pai e filha que são colocados para fora e realmente entregam uma conversa que os personagens precisavam ter e que caminha para o amadurecimento da relação entre os dois marcada por alguns ressentimentos. E Jones e Murray tem cenas incríveis juntos, seja com as crianças durante uma tarde de brincadeiras no apartamento, durante um almoço de aniversário em um restaurante chique, ou até mesmo de tocaia em um carro antigo conversível em alta velocidade pelas ruas de Nova York.
Com uma trilha sonora muito bem escolhida e que combina com o tom leve e descontraído que a produção se apresenta, On The Rocks faz um charmoso e divertido filme que se garante e dá muito certo por conta de seus atores principais que entregam ótimas atuações que mereciam destaque na temporada de premiação que se aproxima.
Como um filme original Apple, On The Rocks fecha o primeiro ano do serviço de streaming da gigante de tecnologia em altíssima nota e um que precisa estar na lista dos cinéfilos.
On The Rocks chega em 23 de outubro no Apple TV+.
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