Talvez a parte mais interessante de O Estrangulador de Boston (Boston Strangler, 2023) fique com a forma como sua história é contada.
Em vez de focar no assassino em si, e faz o espectador cair de cabeça numa trama sobre a mente, suas as motivações, como tem rolado ultimamente em produções de true crime como Mindhunter, BlackBird e Dahmer, o roteiro de Matt Ruskin (que também cuida da direção) troca as percepções dessa história, onde em O Estrangulador de Boston vamos olhar para esses casos que assolaram a cidade Boston nos anos 60 para um prisma bem mais interessante de se acompanhar.
O foco está nas duas jornalistas que investigaram o caso e levaram uma luz para os acontecimentos na cidade enquanto a polícia não fazia muita questão de seguir em frente com os incidentes, e demoraram para conectar as pistas, numa época onde a palavra assassino em série nem tinha sido criada e que haviam poucas mulheres em profissões dominadas por homens.
Mas ao mesmo tempo que é louvável a ideia de Ruskin em focar nas duas jornalistas e nos seus percalços em uma época onde o cenário jornalístico, e a sociedade de maneira em geral, era extremamente dominada pelos homens, O Estrangulador de Boston peca pela forma que resolve contar essa história.
Afinal, ao tentar misturar um drama de crime, com um drama sobre as dificuldades das jornalistas, tanto o roteiro, quanto o filme de maneira geral, sofre um pouco com um ritmo e com a trama rocambolesca, afinal, O Estrangulador de Boston precisa equilibrar essas duas vertentes e não consegue trabalhar muito bem com elas. Mas quando trabalha, olha é um acerto e tanto, afinal, Keira Knightley e Carrie Coon sustentam o filme e o fazem ser um para ser visto com certeza, e justamente, por conta do trabalho dessas duas excelentes atrizes.
As duas estão ótimas como essas jornalistas, as únicas de um jornal de Boston, que se unem, às duras custas para investigar os assassinatos dessas mulheres. O longa mostra a jornalista e mãe de família Loretta (Knightley) que quer tentar deixar o seu posto na sessão de Estilo e trabalhar em matérias mais elaboradas e que começa a reunir provas e a investigar diversos casos que em um primeiro momento pareciam ser aleatórios, mas que ao se tornarem uma obsessão para ela, a fazem ligar os pontos e descobrir que existem um padrão e uma forma única que esse assassino ataca suas vítimas.
Ao se aliar com Jean (Coon), uma jornalista mais veterana e realmente tem seu espaço no jornal que elas trabalham, a dupla parte em busca de pistas para comprovarem suas teorias. Em um determinado momento é interessante ver como essas mulheres pensavam, e agim dentro do contexto dessa época, como elas faziam para tentar investigar esses casos, e os caminhos que elas tomavam e que os detetives da polícia não percorriam, como também usam a sua “invisibilidade” para conseguirem informações.
Até que suas fotos são estampadas nas matérias para divulgação dos casos, que o jornal deu em primeira mão e antes da polícia, e a situação, que já era difícil, se complica para ambas. O Estrangulador de Boston então vai mostrar a investigação de Loretta, ao lado da investigação do detetive Conlay (Alessandro Nivola) e como eram as estruturas de poder da época num retrato, ao mesmo tempo, fascinante e alarmante do contexto social que essas pessoas viviam.
O fato de Loretta e Jean serem totalmente desacreditados por todos, alguns dos colegas, pelo editor-chefe Jack McClane (um ótimo Chris Cooper), pelo chefe deles Eddie (Robert John Burke) e as disputas políticas que envolveram o caso, apenas dá um pouco mais de sustância para o longa, principalmente quando depois da ajuda das matérias, a polícia consegue achar, e identificar alguns suspeitos, e até mesmo prender algumas pessoas de interesse no caso.
Mas também parece que as coisas são muito apressadas, onde fica claro que a trama, e muito desses personagens, não tem tempo para serem desenvolvidas. É o caso de mostrar a relação pessoal desses personagens, onde, por exemplo, vemos que o casamento de Loretta está em conflito, mas temos poucas cenas da personagem com sua família, e seu marido James (Morgan Spector). É o famoso caso que tem dado um pouco de trabalho em Hollywood nos últimos anos, com a popularização do streaming, e a forma de contarmos história, de que esse filme seria uma boa minissérie se tivesse mais horas para trabalhar esses personagens.
É uma coisa que prejudica sim, O Estrangulador de Boston, mas que é compensado quando temos um bom trabalho de atuação, de criação e recriação de época, onde o que temos é um filme muito interessante e imersivo de se assistir que faz você cair de cabeça nessa história com esse toque de drama noir, com uma coloração escura e depressiva, para querer saber mais sobre o caso (onde boa parte dos assassinatos nem são mostrados apenas sugeridos ou com a câmera distante e em partes em outro cômodo) e o que aconteceu com essas mulheres nesses momentos tão cruciais de suas vidas, tanto pessoais, quanto profissionais.
No final, o maior triunfo de O Estrangulador de Boston não é contar a perturbada história desses assassinatos, nem glamourizar esses atos e quem os fez, como aconteceu em outras produções do gênero, e sim, focar nas histórias que realmente valem serem contadas, as histórias dessas mulheres.
Onde assistir O Estrangulador de Boston?
O Estrangulador de Boston chega no Star+ em 17 de março.