Os Enforcados é o novo filme de Fernando Coimbra que além de dirigir o projeto também cuida do roteiro. E serve como um olhar para um Rio de Janeiro mais malandro e cheio de pequenos golpes para ver quem vai se dar melhor.
Com o samba, com o jogo do bicho, com as praias, representado em tela, Coimbra comenta como sobre tudo isso ajuda a trazer uma representação do Brasil lá para fora, mas que também é um filme que vai apelar para atrair o público brasileiro sim: “É um filme muito sobre o Brasil, e eu acho que o brasileiro vai entender muito mais as camadas que ele tem [e oferece] do que os gringos.” comenta o diretor em nosso bate-papo.
Protagonizado por Leandra Leal e Irandhir Santos, o longa segue o casal, Regina e Valério, que se vê envolvido em diversas situações das mais malucas possíveis quando chegam no Rio de Janeiro e precisam lidar com a família dele que comanda boa parte das operações ilegais da cidade. Em vez de vender sua parte, eles resolvem, passar a perna no tio de Valério, tentar assumir tudo. No meio do caos, e cheio de traições, e puxadas de tapetes, Regina e Valério vão descobrir que o tal plano perfeito deles não é tão perfeito assim.
Assim, Os Enforcados se desenrola e vira uma “espiral de violência que parece não ter fim.” afirma a sinopse. E é basicamente o que a atriz Leandra Leal, confirma em bate-papo sobre o longa nacional que fez pré-estreia mundial no Festival de Toronto e teve sua primeira exibição no Brasil no Festival do Rio antes de fazer pré-estreia também na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo que acontece nos próximos dias.
Antes da primeira exibição do filme no país, conversamos com o diretor Fernando Coimbra e os protagonistas de Os Enforcados. Confira:
Os Enforcados tem muita coisa que automaticamente nos remete ao Rio de Janeiro como praias, jogo do bicho, samba, e tudo mais. Você acha que tudo isso são figuras, ou até mesmo arquétipos que ajudam a divulgar o Brasil lá fora? Tendo em vista que o longa fez pré-estreia no Festival de Toronto?
Fernando Coimbra: Antes de tudo acho que essas questões são arquétipos para cá [o Brasil] mesmo. Assim, funcionam lá fora também, mas acho que o brasileiro entende ainda mais profundamente sobre o que o filme fala. Acho que o filme tem uma história universal, tem um gênero do thriller que também é uma coisa universal e que funciona lá fora, mas é um filme muito sobre o Brasil, e eu acho que o brasileiro vai entender muito mais as camadas que ele tem [e oferece] do que os gringos. Acho que a galera aqui vai entender mais.
E como foi lançar o filme por lá no Festival de Toronto?
Fernando Coimbra: Foi incrível! Toronto é um festival que tem muito público. É público mesmo de verdade. É como aqui [no Festival do Rio] que tem também, como vai ter amanhã no Odeon [na segunda das três sessões que o filme teve]. Por que às vezes tem festival que fica só aquela galera mais de festival, da indústria, o que também é legal, mas lá você tem uma procura de público, e tem muito filme passando ao mesmo tempo, as sessões lotadas, esgotadas, já que as salas são enormes lá. Então fiquei muito feliz de ver que estavam lotando os cinema e ver a reação do público foi muito forte também, então foi bacana de acompanhar.
E como foi chegar nos nomes de Leandra Leal e Irandhir Santos para os protagonistas?
Fernando Coimbra: A Leandra eu já tinha trabalhado com ela O Lobo Atrás da Porta (2014) e a gente vinha querendo trabalhar junto já há muito tempo, voltar a trabalhar junto, e deu muito certo O Lobo… e eu tinha esse projeto de Enforcado, mas eu ainda tava escrevendo, e a princípio, não tava ainda muito preso a ninguém, então eu tava entendendo ali, o tom dos personagens. Mas aí, a partir do momento que eu pensei na Leandra, por que eu tava com essa vontade de trabalhar com ela de novo, eu falei, Cara [é isso!]. Eu li o roteiro de novo e vi a Leandra na minha cabeça e consegui simular ela fazendo assim e falando: “Nossa isso aqui vai ficar mais profundo e mais complexo do que eu imaginava que ia ficar. “
A Leandra trás muitas camadas assim para a personagem, muita mesmo, seja de vida interior, ela transita do humor para o trágico para a dor. E o Irandhir é um ator que eu já vinha querendo trabalhar tem muito tempo já. Eu conheci ele no Festival de Brasília, eu acho, que eu tava com um curta metragem, ele ainda não tinha estourado, mas eu tinha visto em um filme, eu tinha gostado, e vira e mexe a gente se encontrava. Então foi de eu acompanhar o trabalho dele. Sou fã do trabalho dele, e ele é um cara que eu queria trabalhar. E para Enforcados, foi quando caiu a ficha [que poderia ser ele]. Já que você fica cogitando, ali, putz poderia ser o Irandhir. É isso, Irandhir é o cara.
E depois é um problema né? Por que depois ele tem que poder fazer o filme. E querer fazer o filme. E ele faz um personagem que é a Zona Oeste do Rio, de uma família emergente, que veio do jogo do bicho, de fora do Rio, que se estabeleceu, e ele tem muito haver com esse personagem. É um personagem intenso e que tem uma grande transformação. E o Irandhir é esse cara mega versátil e que a entrega é muito grande. Aí eu falei, não vamos mandar o roteiro, vamos mandar o roteiro que ele vai gostar por que é a cara dele. Ele leu e topou na hora.
E os dois não tinham feito um filme juntos ainda, contracenando. E conhecendo os dois eu sabia que era uma coisa que ia dar bom, ia dar uma ligar aqui, por que os dois são muito focados, são muito concentrados, e eles tem uma semelhança em como trabalhar e deu uma química maravilhosa entre eles.
E quanto tempo levou para gravar o filme de maneira geral? Como foi o processo de gravações?
Fernando Coimbra: Olha as filmagens, eu acho que foram entre 6 e 7 semanas. Dá umas 30 e tantas diárias. Começamos a filmar em 2022, em outubro, e fomos até dezembro, filmamos no meio da Copa, na pandemia, teve eleição, no final de um governo meio despertador. Tava rolando segundo turno e foi um momento bem louco de filmar e que de certa forma trás isso para o filme.
O trailer do longa realmente mostra que o filme tem diversas reviravoltas. Como foi para você receber o roteiro de Os Enforcados e como foi o seu processo de leitura? Você leu só suas partes, você tudo de uma vez?
Irandhir Santos: Olha eu li tudo [de uma vez] e te falar que foi uma uma leitura assim tomada sabe? Uma leitura inteira, uma leitura, assim, sem parar. E já na leitura, o roteiro já me mostrou que esse filme, tem um imã, pela uma sucessão de acontecimentos, onde você quer acompanhar a história desse casal que recebe uma herança que eles têm que dar conta disso.
E ver as atitudes e escolhas que vão determinando esse caminho deles. Então me interessava muito ver, a cada página, quais atitudes e quais escolhas, esses dois faziam, e ver o que acontecia na página seguiu. Então isso me prendeu muito. Eu fiquei chocado, e ao mesmo, quis contar [e fazer parte dela]
E tem alguma coisa que você possa contar, sem spoilers, que você leu e pensou: Nossa será que vai acontecer isso com esse personagem e lá na frente aí foi lá e aconteceu?
Irandhir Santos: Cara te falar que não! Não, não. Por que o roteiro, te dava caminhos que você caia, como leitor, na dúvida. Te fazia duvidar da postura, te fazia duvidar das ações do personagem, do tipo [de pensar]: Ele não vai fazer isso!!
E ele vai lá e faz! Mas aí depois que ele faz, eu ficava: Ele não vai fazer mais! e ele ia lá, e fazia de novo, né? Então, o Fernando, na sua escrita, ele ia dando, ia criando, essas dúvidas, para quem lia, ficasse na dúvida, se aquele personagem ia dar aquele passo, e ele brinca com isso para quem lia o roteiro.
E como foi trabalhar com a Leandra Leal em Os Enforcados? Como foi para vocês construirem essa essa relação? Porque vendo pelo trailer, parece que a dinâmica de poder entre esses dois personagens devem mudar ao longo do filme. Uma hora ela deve estar no alto, outra hora ele… como foi?
Irandhir Santos: Eu acho que você foi muito certo na sua observação! E houve um grande jogo, entre nós dois… um jogo que não foi acordado, mas que acho que tem muito haver da maneira como nós trabalhamos. Adorei trabalhar com a Leandra, por que eu me identifiquei muito na maneira de como ela trabalha. Na pesquisa profunda que ela faz, na entrega total que ela estabelece, na disposição de estar aberta as colocações, e ao surgimento de coisas novas.
Me identifiquei muito na maneira de trabalhar dela. Eu acho que ali, ao identificarmos isso, deu para gente se identificar e estabelecer esse jogo que começou a ser jogado na preparação. Mas que também perdurou durante todas os dias de filmagens. Eu acho que o jogo que fizemos desde da preparação até as gravações contribuiu e muito para que isso acontecesse [e transparecesse] no filme.
Ter esse cenário do Rio de Janeiro e de outras coisas que remetem ao Rio de Janeiro como praias, jogo do bicho, o carnaval, você acha que isso ajuda a levar esse filme para fora do Brasil já que vocês fizeram pré-estreia no Festival de Toronto?
Irandhir Santos: Ah sem dúvidas! Acho que existe uma expectativa, principalmente, nesses pontos, já tão conhecidos nossos. O nosso Carnaval é conhecido em todo mundo, mas os bastidores dele, quem patrocina isso, são os pontos curiosos e ainda a serem descobertos. E o nosso filme trata de uma certa forma sobre isso. Eu acho que é exatamente isso, é um ponto novo, que dá luz, para sabermos mais sobre a nossa cultura, sobre esses nossos assuntos conhecidos.
Você já fez muita novela e agora tem esse filme esse filme aqui. Como você encarra trabalhar em uma novela em que você tem essa história um pouco mais continua em relação a um filme que você tem um personagem com uma história fechada numa quantidade de tempo mais limitada?
Irandhir Santos: Cara, para mim, eu trato tudo como uma mesma página em branco, assim. O meu debruçar sobre essa página, para mim, é o mesmo, seja na TV, seja no cinema. A única coisa diferente, para mim, como ator, no processo de um e de outro, é por que no cinema, ele já tá feito, já tá pronto, e hoje vou assistir. É aquilo o resultado. Na televisão, acompanhamos uma história que está sendo contada. E, de alguma forma, isso dá mais possibilidade, para você ir acertando, de ir consertando, e ajustando as coisas que você acha que deve ser ajustada né? Essa é a diferença, que eu vejo.
Isso me causa para a novela, como se eu fosse um artista em processo e vou descobrindo ao longo da história, a melhor forma de contar aquele personagem. E no cinema, eu vejo com um mergulho único, é aquele momento de acontecer, e que não vou ter mais como mudar lá na frente.
Pelo trailer fica claro que a sua personagem e o personagem do ator Irandhir Santos tem uma relação bastante curiosa, e uma relação de poder, que varia muito ao longo do filme. Como foi trabalhar com ele para criar essa dinâmica entre a Regina e o Valério em Os Enforcados?
Leandra Leal: Foi um luxo né? O Irandhir é um ator maravilhoso, o cara um super concentrado, generoso. Fo incrível. Eu já queria muito ter trabalhado com ele, foi a altura da minha expectativa.
E como foi para você receber o roteiro de Os Enforcados? Como foi a primeira leitura? Por que o filme é um que tem bastante reviravolta, tem algum acontecimento que você achou que “Nossa não achei que iria para esse caminho?” ou que te surpreendeu de alguma maneira?
Leandra Leal: Olha cara, te falar que sem dar nenhum spoiler, mas a sequência final do filme é uma loucura. É a grande reviravolta, essa é a grande reviravolta. A sequência final, muito [surpreendente]. Eu não imaginava.
Os Enforcados faz parte da programação do Festival do Rio e terá sessões também na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. A previsão de estreia no circuito comercial é para 2025.