Colette, é intrigante de ser visto nos dias de hoje.
Mais que uma biografia; uma intensa crítica. O filme, que é inspirado na história real da autora Sidonie-Gabrielle Colette, mais conhecida como o único vocativo que dá nome ao mesmo, Colette, é intrigante de ser visto nos dias de hoje. Isso dado à conscientização crescente a respeito de relacionamentos abusivos – familiares ou românticos – identidade de gênero, sexualidade e também machismo enraizado por gerações.
Gabrielle (Keira Knightley) é uma garota que vive no interior da França, uma típica criança do campo. Seu pai (Robert Pough) passara um tempo servindo seu país na guerra, o que o levou a conhecer o jovem Willy (Dominic West). Ele e Gabrielle se apaixonam e logo se mudam para Paris, onde Willy trabalha como agente de livros, isto é, publica as obras em seu nome e reparte o lucro entre os verdadeiros autores, porém não auxilia na escrita.
Ao se deparar com dívidas e gastos excessivos devido à vida de alto padrão em Paris, Willy sugere que Gabrielle escreva suas novas histórias. A jovem, inicialmente insegura, certa noite cria coragem e escreve um romance, narrado em primeira pessoa por uma garota chamada Claudine. Gabrielle busca inspiração em suas próprias vivências no campo, e assina a obra como Colette, nome que passa a usar sempre que se apresenta. Logo após sua publicação, As Aventuras de Claudine se torna um sucesso em toda a França. O autor, porém, é registrado como Willy.
Com o sucesso do livro, é sugerido que seja publicado um segundo e, após deste, um terceiro. A partir daí, Claudine apenas ascende até se tornar uma marca: cigarros, balas, roupas levam o nome da personagem, gerando um lucro cada vez maior.
Tendo o problema do dinheiro resolvido, Gabrielle, agora conhecida como Colette, se envolve com uma jovem recém-casada, chamada Georgie (Eleanor Tomlinson). O caso logo acaba quando descobre que seu marido também se encontra com a mesma moça. Um tempo depois, outra jovem entra em cena. Em uma festa comemorando a adaptação de Claudine para o teatro, Colette conhece Missy.
Missy, para a época, era uma figura muito peculiar. Tem traços delicados e femininos, corpo e curvas de uma mulher. Usa, porém, um corte de cabelo curto de um padrão masculino. Se veste também como um homem. Usa calças de tecido grosso e escuro. Ela logo consegue a atenção e fascínio de Colette.
As duas iniciam uma relação leve e sem compromisso. Meramente sexual, porém intensamente amigável e companheiresca. Missy logo expande o olhar de Colette para muitos fatores que lhe causaram angústia durante todo seu casamento com Willy. Ela sabe, por exemplo, que não fora ele que criou Claudine e que, grande parte do relacionamento do casal é marcado por uma grande manipulação emocional.
Colette constantemente deixa em alerta os tipos de abuso que uma mulher pode sofrer sem mesmo perceber o que está vivenciando, e isso é um forte ponto para o roteiro. Keira Knightley faz uma ótima interpretação da protagonista e, com Dominic West, faz um belo retrato de um casal no início do século XX.Uma vez inserida em um contexto sua vida inteira, ela apenas aceita como as coisas são. Não questiona pois não há o que ser questionado, apenas é como é.
Por ser uma mulher naquele tipo de sociedade, Colette não é livre. Nem sequer sua mente e seu talento pertencem a si mesma: vez que colocados em um papel, leva o nome de seu marido. Ela não usa as roupas que lhe trazem conforto, mas aceitação dos olhares de outros.
Este é o último roteiro escrito por Richard Glatzer, falecido em 2015 aos 63 anos. Glatzer já havia trabalhado com o diretor de Colette, Wash Westmoreland, em Para Sempre Alice, de 2014. Colette, porém, não possui nada técnico em termos visuais que mereça destaque, como direção de arte e fotografia. Trata de uma história muito bem contada que, tristemente, se não se tratasse de acontecimentos reais, talvez não causasse tal alarme em seus espectadores.
Colette tem previsão de estrear no Brasil em Dezembro.